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#EducaçãoEmDebate

EaD versus realidade da Escola Pública

Por Wilson R. B. de Araujo
E.E. Rita Bicudo Pereira, Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, D.E.Norte 2
Aprender a Ler

Desde 1996 atuo nas escolas públicas estaduais de São Paulo como professor de Física. Foram dez escolas, pertencentes a quatro diretorias de Ensino. Esta experiência docente faz parte de um grande contingente de professores da rede estadual que dão aulas em mais de uma escola, e que, portanto, conhece várias escolas e suas realidades, tal como eu. Não é preciso aprofundamento teórico para conhecê-las. A simples vivência já basta para constatar que a realidade da escola pública estadual e de seu sucateamento, não apenas desde o começo do "reinado tucano", mas desde antes.


Das dez escolas nas quais estive, somente três delas dispunham de espaço para o laboratório, mas em nenhum deles com condições efetivas para serem usados: falta de materiais para realização de experimento e falta de tempo para o professor, dentro do horário de trabalho, para planejar a logística necessária e a elaboração do conteúdo a ser dado. Estes pontos estão entre os principais problemas neste drama. No entanto, nas três escolas onde atuo atualmente, nenhuma tem ao menos o espaço de laboratório para o exercício de aulas experimentais.


Dito isto, não quero aqui discutir esta questão pontual, mas de colocá-la no conjunto de evidências que mostram a degradação da escola pública nos seus espaços. Em todas as dez escolas nas quais trabalhei, o espaço escolar foi carente de biblioteca, laboratório, sala de informática, tendo como "samba de uma nota só" o confinamento de alunos na sala de aula.


Por outro lado, também, desde 1996, só o tenho visto proliferação de documentos oficiais: LDB, Parâmetros Curriculares Nacionais, Diretrizes Curriculares Nacionais para formação de Professores, Plano e desenvolvimento da Educação, Reforma do Ensino Médio, BNCC, entre outros. E, concomitantemente, se ouvia que a escola continuava no século XIX, e que não entendia as mudanças do século XXI. Enfim, ficou a forte impressão de dois mundos paralelos que não se comunicam: O mundo das mudanças feitas pela burocracia, através de seus documentos oficiais, e o mundo da realidade da escola pública, que não é enxergado pelo primeiro.

É à luz deste panorama que quero registrar o que está acontecendo nesta época de pandemia, sob um olhar individual. A partir do dia 16 de março, a Seduc passou a tomar decisões centralizadas, como tem feito com as políticas educacionais em andamento(MMR, INOVA, Escolas PEI e NOVOTEC), tirando a autonomia das escolas de pensarem o que fazer com seus alunos. E o fez através de vários meios, entre os quais, comunicados desencontrados, dando a forte impressão de que as decisões estavam sendo tomadas por gente que parecia estar "batendo cabeça". Sem entrar em detalhes destes desencontros o que é relevante colocar aqui foi que, durante a semana até o dia 20/03/2020, as diretorias de ensino determinaram que os professores enviassem atividades pela internet. As pressas, enviaram vários tutoriais com exemplos de atividades que os professores pudessem pedir aos alunos, entre uma variedade de atividades cujo propósito era apenas de cumprir avaliações previstas para o primeiro bimestre. Ou seja, para serem cumpridas burocraticamente.


Mas além de não parar por aí, foi só o começo de uma série de arbitrariedades. Já a partir do dia 23/03/2020 foi decretado recesso de duas semanas, seguido de 15 dias de férias. E, embora não tivesse sido decretado convocação pelo DOE, os professores foram permanentemente assediados pelos coordenadores de escola para que fizessem atividades à distância, repassando determinação das diretorias de ensino. As mensagens de obrigatoriedade não cessaram, mesmo com publicação no DOE de 19/03/2020 de deliberação do Conselho Estadual de Educação (CEE) de que "ensino à distância é permitido, mas não obrigatório" . Curioso também notar depoimentos de professores que postaram atividades para suas turmas onde nenhum de seus alunos acessou os canais virtuais de comunicação para fazer as atividades solicitadas. Será que são manifestações da realidade contra as determinações burocráticas, agora em nível virtual?


As "aulas" retornaram na rede Estadual neste dia 22/04, à distância, com a determinação repassada pelos professores coordenadores de que "As aulas ministradas seguirão o Currículo Paulista". Ou seja, os alunos, discriminados por séries, nas plataformas virtuais, terão os
conteúdos das aulas de acordo os bimestres, a revelia de seus professores, sendo que muitos deles não seguem a ordem estabelecida arbitrariamente pela grade curricular.


Finalizando, quero destacar os embates que vejo como realidade versus determinações burocráticas, esta ultima representada pelas arbitrariedades daqueles que estão no poder. Os pontos que quero destacar são:


1- Com relação as arbitrariedades cometidas pela Seduc: Envio de orientações e comunicados muitas vezes exercidos pelo "pequeno poder" de dirigentes, a revelia de legislações publicadas em diário oficial [2, 3], e quando menciona qualquer legislação , o faz de acordo
suas conveniências.
2- Questão da obrigatoriedade de ensino a distância, que não é mencionada na Portaria no. 343, de 17 de março de 2020, na qual o MEC autorizou em caráter excepcional a substituição das disciplinas presenciais em andamento por aulas que utilizem meios de ensino à distância.
3- A questão da legalidade de se refazer novo planejamento, na "volta as aulas", quando há a argumentação legal em contrário de que este período e de suspensão de aulas.
4- A delicada questão da edição da recente medida provisória [1] que dispensa, em caráter excepcional, o cumprimento dos 200 dias letivos, mas não o mínimo de 800 horas, o que praticamente obriga a substituição das aulas presenciais por ensino à distância.
5- De que tem sido muito repercutido entre "especialistas de Educação" que EaD não é o que está sendo feito, sobre uso de tecnologias virtuais, neste tempo de excepcionalidade, pois "EaD é algo estruturado". Importante colocar que uma definição do que é EaD acarreta
em implicações jurídicas sobre o ensino remoto, dando margem a imposição "legal" de arbitrariedades, tais como a "legalidade" do referido ensino remoto.
6- No âmbito pedagógico, ou seja, do aprendizado, importante observar o grau de participação dos estudantes aos aplicativos do governo. Será que se repetirá a não adesão dos alunos, observada desde uma semana antes do recesso e durante este período?
7- Também importante observar como será seguido o Currículo Paulista neste perodo de ensino à distância, e também observar em detalhes as violações da liberdade de Cátedra do professor, e se haverá algo além de conteudismo, ou apenas este.


São estes os pontos que considero como fundamentais no debate sobre o tema proposto neste tempo de excepcionalidade devido a Pandemia, sem perder de vista que o objeto de reflexão principal a ser pensado e o embate "EaD versus realidade da Escola Pública".


[1] MEDIDA PROVISORIA No 934, DE 1o DE ABRIL DE 2020"
[2] DELIBERAC~AO CEE 177/2020, Página 18 da Executivo - Caderno 1 do Diário Oficial do Estado de São Paulo (DOSP) de 19 de Março de 2020
[3] "Apeoesp Informa Urgente", interpretação da deliberação CEE 177/2020, nos tens e): A deliberação N~AO OBRIGA QUE OS PROFESSORES DA REDE PUBLICA DE ENSINO DO ESTADO DE SÃO PAULO UTILIZEM PRATICAS ACAD^EMICAS RELACIONADAS AO ENSINO A DIST^ANCIA. f) Porém, não proíbe essa possibilidade.

**Este espaço é reservado para a publicação mensal de artigos de opinião que apresentem experiências e reflexões acerca da educação. O conteúdo do artigo é de inteira responsabilidade do articulista e não reflete, necessariamente, a opinião da APEP.

 

Caso tenha interesse em publicar neste espaço, encaminhe seu texto para: apepeducacaoemdebate@gmail.com

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